Era para ser um dia comum na vida de Gabriel Bonelle Pereira, 17 anos, que sempre foi um apaixonado por esportes. Com o skate debaixo do braço, ele saiu de casa para dar uma volta, como costumava fazer frequentemente. Não fez nenhuma manobra arriscada, nem desceu nenhum corrimão ou pulou uma rampa qualquer, mas, entre um movimento de passada e outro, acabou se desequilibrando e caiu. A queda, que a princípio parecia branda, lhe rendeu uma perna engessada por mais de um mês.
O problema começou após a retirada do gesso, quando o garoto começou a sentir dores fortes e incapacitantes na região do tornozelo esquerdo. “Eu realmente pensei que seria algo normal de se sentir após uma queda, mas não imaginava que algo tão grande estava por vir”, comenta.
O ano era 2013. Foram mais de seis meses, entre vários exames e idas e vindas a diversos médicos. A dor continuava, se tornava cada vez mais incômoda e alguns caroços na região da perna já sinalizam que a doença poderia ser grave. Nesse período, o menino que nasceu no município de Serra, no Espírito Santo, teve que parar de vez com o skate e com o surf . No final daquele ano, após um raio-x, um ortopedista chegou a suspeitar que pudesse ser um tumor ou uma osteomielite (doença infecciosa grave que afeta os ossos).
Chegou a fazer biópsia, mas o resultado foi inconclusivo. A mãe de Gabriel, dona Márcia, já angustiada com a espera por um diagnóstico, ouviu na ocasião boas referências sobre o Hospital de Câncer de Barretos. Entrou no site da entidade e resolveu falar com o setor de oncologia. “Foi uma enfermeira chamada Patrícia que me atendeu e foi muito atenciosa. Ela pediu que eu mandasse todos os exames do Gabriel, disse que eles iriam analisar e me dar uma resposta. Isso foi numa quarta-feira. Na sexta-feira eles me ligaram e pediram que ele fosse para Barretos o quanto antes”.
Márcia relata que foi um alívio tremendo descobrir que existia um local de referência no estado de São Paulo e ainda por cima gratuito e aberto a população. “A gente ouvia falar muito de Barretos por conta da festa do peão, mas não imaginava que havia um hospital tão bom igual a esse”. Ali, o diagnóstico veio rápido: osteosarcoma na tíbia distal esquerda. Um dos tumores malignos mais comuns em crianças e adolescentes.
O cotidiano no hospital
De fala mansa e com os celular nas mãos, Gabriel fala tranquilamente sobre o episódio que resultou no diagnóstico e culminou na perda de parte de sua perna esquerda. Sentado no banco do jardim do hospital infantojuvenil de Barretos, ele mexe em sua prótese e diz que já se adaptou. Está em tratamento na instituição desde janeiro de 2014.
Como o tumor evoluiu rápido, a amputação de parte do membro foi necessária a fim de que as células cancerígenas não se espalhassem pelo restante do corpo. Mesmo assim, Gabriel teve que passar recentemente também por uma cirurgia para tirar uma pequena lesão que se formara no pulmão. Tirando isso, conta que se sente bem.
Passou por sessões de químio, perdeu o cabelo, mas não o bom humor e a esperança. Em Barretos, fez um grupo de amigos e juntos eles passeiam, vão ao shopping, tomam sorvete. Gabriel também gosta de tocar violão no hospital para alegrar os companheiros. “A cidade não é preparada para adolescentes, então eu fiquei com muito medo de ele cair numa depressão, porque a gente deixou tudo no Espírito Santo, né? Família, amigos, tudo. Mas ele está lidando muito bem e isso deixa a gente muito confiante”, diz Márcia.
Gabriel, que está atualmente no segundo ano do ensino médio, não deixou de estudar por conta do tratamento. Assim como é para outras crianças e adolescentes internados ali, as aulas acontecem dentro do próprio hospital, com professoras especializadas. O aluno fica vinculado a uma escola estadual de Barretos, então, mesmo que não frequente presencialmente, ele faz provas e tarefas que são repassadas para uma planilha individual e depois para os colégios nos quais estão matriculados. As aulas acontecem de segunda a sexta-feira, das 7h às 11h30, no ambulatório e na ala de internação da unidade infantojuvenil.
Vida em Barretos
A mãe de Gabriel olha orgulhosa para o filho e conta sobre a dificuldade de deixar toda a família e começar do zero em Barretos. O tratamento dele ainda não possui data para terminar, por isso a vida da família está toda concentrada ali. Sua única irmã ficou no Espírito Santo por conta da faculdade, mas eles acabam se falando quase que diariamente por mensagens. Não foi fácil sair de uma cidade onde a família conhecia tudo e todos e se mudar para um local distante, mas acreditam que o retorno será breve.
Seu Carlos, pai de Gabriel, que trabalhava de enfermeiro num hospital no Espírito Santo, decidiu pedir as contas do emprego quatro meses depois que o filho iniciara o tratamento em Barretos. Na nova cidade, a família morava na “Casa Acolhedora Vovô Antônio”, um abrigo totalmente gratuito destinado aos pacientes e familiares daqueles que estão em tratamento no hospital. Atualmente, a família decidiu alugar uma casa, por conta da comodidade, e o pai conseguiu uma ocupação no setor de enfermagem do hospital para adultos.
Campanha
O sonho do capixaba atualmente é conseguir uma nova prótese. “Sou muito grato por essa que o hospital me concedeu, mas eu preciso de uma que me dê mais mobilidade e flexibilidade”, explica ele.
Consultou um médico especialista que lhe recomendou uma nova, mas o problema é que o artefato custa cerca de R$24 mil. Como a família não possui recursos para adquirir a prótese, Gabriel decidiu recorrer ao chamado crowdfunding (financiamento coletivo). Além disso, ele mesmo criou uma campanha no facebook intitulada “Força Bonelle“, onde relata sua história e fala da sua rotina. “Não vejo a hora de voltar a surfar novamente. E de fazer kitesurf, também”.
Quem quiser ajudar pode obter mais informações clicando aqui.
O Instituto Vencer o Câncer é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), fundada pelos oncologistas Dr. Antonio Carlos Buzaid e Dr. Fernando Cotait Maluf, com atuação em 3 pilares: (1) Informação de excelência e educação para prevenção do câncer. (2) Implementação de centros de pesquisa clínica para a descoberta de novos medicamentos. (3) Articulação para promoção de políticas públicas em prol da melhoria e ampliação do acesso à prevenção, ao tratamento e à cura do câncer.