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Falta de sensibilidade de médicos é queixa frequente de pacientes

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São frequentes as queixas dos pacientes oncológicos em relação à falta de sensibilidade de alguns médicos na hora do diagnóstico. Frases como “quantos anos você tem? Você é muito nova para ter esse tipo de câncer” ou “não estou preocupado com sequelas, só estou preocupado em retirar o tumor da sua cabeça”, por mais absurdo que possa parecer, foram ouvidas por pacientes no momento em que descobriram a doença.

Leia mais sobre o assunto: Câncer: como dar a notícia?

Falta de empatia ou de sensibilidade é tema delicado e merece reflexão. Luciana Holtz presidente do Instituto Oncoguia (entidade sem fins lucrativos que dá apoio ao paciente com câncer), relata que o modo de comunicar o diagnóstico sem gerar alarde e ao mesmo tempo sem omitir tópicos essenciais sobre a enfermidade pode fazer toda a diferença na hora da aceitação do tratamento e na diminuição da ansiedade.

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Pequenos gestos, como chamar o paciente pelo nome, conceder o número do telefone celular para que a pessoa ligue em caso de dúvida, não dar uma notícia desagradável no corredor do hospital ou na sala de espera, não fazê-lo esperar horas no consultório para ser atendido, explicar de maneira didática sobre aquele tipo de câncer (vale usar desenhos e vídeos, porque nem todo paciente tem obrigação de saber o que é um glioblastoma) ajudarão a pessoa a se sentir mais confiante. “Certa vez, uma mulher ligou aqui no Instituto e reclamou: ‘ele [médico] nem me deu um abraço na hora do diagnóstico’. Na verdade, as pessoas esperam um pouco de empatia por parte dos profissionais nesse momento tão delicado”, afirma Luciana.

Holtz, que também atua como psico-oncologista, explica que o diagnóstico de um câncer tira o chão de qualquer pessoa. Entretanto, o direcionamento que o médico dá a partir disso é que vai trazer confiança ao paciente. “É necessário apontar como vai ser o tratamento, os possíveis efeitos colaterais, a eficácia, mostrar qual vai ser o próximo passo.”

O impossível pode acontecer

Dr. Luiz Paulo Kowalski é um dos cirurgiões oncológicos mais renomados do país. Entre seus pacientes está o ex-presidente Lula, que teve um câncer na laringe em 2011. É diretor do Departamento de Cabeça e Pescoço do hospital A.C. Camargo Cancer Center, em São Paulo, e num único dia realiza até 15 procedimentos cirúrgicos.

De fala mansa e pausada, Dr. Kowalski relembra o momento em que passou da condição de médico para paciente. Em 2007, ele recebeu das mãos da própria equipe um diagnóstico de um tumor na região da parótida. Tratava-se de uma lesão benigna na glândula salivar. Entretanto, sua equipe detectou no momento da operação uma extensão intra-óssea que não fora observada pelo exame de imagem prévio. O fato de encontrar um tumor diferente e que traria um grau de mutilação alterou toda a rotina de previsibilidade médica. Resultado: a cirurgia que tinha previsão de durar três horas com alta no dia seguinte levou mais de 10, com direito internação na UTI. O procedimento para a retirada do tumor deixou o médico com parte do rosto paralisada, sequela que depois foi revertida com fisioterapia.

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Segundo o dr. Kowalski, ter sido paciente ajuda a entender a angústia e o medo. Foto: Gislaine Miyono

Conversar com o paciente, explicar sobre a doença, as perspectivas do tratamento e as consequências já eram praxe na rotina do médico. Mas, talvez, o jeito de falar com o paciente é que mudou. Kowalski explica que a vivência na sala de cirurgia lhe mostrou que, embora muitas vezes a convicção do diagnóstico seja praticamente certa, os riscos, por mais raros que possam ser, existem e precisam ser ditos. O objetivo é que o paciente não seja pego de surpresa por algo que era praticamente impossível, mas aconteceu.

“A pessoa não precisa necessariamente passar pela doença para sentir o que deve fazer pelo seu paciente, mas é claro que a vivência sempre tem um impacto, uma mudança. Estar do outro lado ajuda a entender a angústia e o medo do outro”, relata.

Na opinião do especialista, a escola médica nunca foi humanizada. Sempre houve aquele distanciamento, o médico na posição de uma autoridade que não podia ser contestada. Atualmente, isso vem melhorando, porque o paciente não é mais aquela figura passiva, que simplesmente abaixa a cabeça. Ele indaga, questiona e vai buscar uma segunda opinião.

“A questão da humanização depende muito da empatia. Para alguns pacientes é possível falar mais abertamente sobre o diagnóstico, mas com algumas pessoas é necessário um pouco mais de cuidado. O médico precisa ter essa sensibilidade”, alerta Kowalski.

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