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Medo e insegurança: a importância do apoio psicológico

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“Na foto do meu passaporte eu estou com cabelo raspado. Hoje está bem diferente. Quando viajo e chego ao setor de imigração me pedem para segurar o cabelo para trás e ficam comparando pra ver se sou eu mesma. Algumas pessoas olham a foto e perguntam. Às vezes, eu falo, às vezes, não”, conta Anne Warth, jornalista de 35 anos que teve câncer na mama direita. Falar sobre a doença foi, por muito tempo, difícil para ela. Muitos amigos sequer souberam o que estava acontecendo. “Eu demorei a falar. Eu percebi que as pessoas não falavam também. Tem gente que nem soube. Quando você conta para as pessoas, tem gente que se desespera, tem gente que quer ficar perto, gente que minimiza. Eu queria evitar ter que contar várias vezes a mesma coisa. As pessoas queriam respostas que eu não tinha. E era uma coisa muito mal resolvida para mim”, afirma.

Só agora, no pós-tratamento, ela se sente mais confortável para falar sobre tudo o que passou, e a terapia tem sido uma aliada nessa fase. “Depois que fiz a mastectomia, tive certeza que tinha que fazer terapia porque eu não aguentava mais, tinha raiva, precisava falar tudo o que eu sentia”, lembra.

Anne não tinha nenhum fator de risco que pudesse explicar o aparecimento do câncer. Era jovem, sempre teve uma vida saudável, praticava atividade física, não tinha casos na família nem mutação genética. Um dia, sentiu que a mama direita estava diferente, percebeu uma mudança no formato do mamilo e procurou um médico. Depois de vários exames, recebeu o diagnóstico. “Eu achava que jamais aconteceria comigo. Por muito tempo fiquei pensando o que eu tinha feito para acontecer comigo. Só quando comecei a fazer terapia me convenci que a culpa não era minha e comecei a lidar melhor com toda a situação”, diz.

A jornalista fez a cirurgia há um ano e meio e sua última sessão de radioterapia foi em maio do ano passado. Hoje faz acompanhamento com consultas médicas e exames. Na terapia, está aprendendo a lidar com o medo e tentando entender melhor tudo o que passou. “Eu tinha medo de metástase, de recidiva. Agora estou melhor, mas ainda trato na terapia essa questão do medo, o medo da incerteza. O câncer não é mais um problema para mim, eu falo sobre a doença. Mas, também não é uma coisa neutra, me causa dor. Como todo paciente ainda me sinto paciente. Talvez porque eu ainda tome medicação e faça acompanhamento. Quando me perguntam se estou curada digo que faço tratamento para o câncer não voltar”, conta.

Terminar um tratamento de câncer é motivo de alegria e alívio para o paciente, mas ao mesmo tempo pode despertar outros sentimentos como medo, ansiedade e insegurança. Retomar os estudos ou o trabalho, tratar as eventuais sequelas da doença e passar pelo monitoramento médico, podem deixar o paciente tenso, apreensivo. “Na fase pós-tratamento, pode haver dificuldade em se traçar planos para o futuro, dificuldade nos relacionamentos, desejo de fazer exames de seguimento mais do que o necessário. O receio da doença voltar é frequente, alguns estudos mostram que até 70% dos pacientes relatam medo da recidiva, e ele não é irracional. Todos esses sentimentos podem gerar sofrimento, que é diferente daquele que é físico. Ele é menos palpável e mensurável, mas pode ser intenso e devastador”, afirma a oncologista Rosely Yamamura, que integra o Comitê Científico do Instituto Vencer o Câncer.

A oncologista acrescenta que o acompanhamento de um psicólogo é fundamental para amenizar os sentimentos que surgem nessa fase. “Ele ajuda o paciente a entender suas próprias emoções e o ajuda a processar o que é novo e a enfrentar a doença e as mudanças associadas a ela. A abertura para o paciente falar e o trabalho em cima dos sentimentos são componentes importantes dentro desse manejo. Com isso, ocorre redução da ansiedade e do sofrimento e melhora da qualidade de vida do paciente”, ressalta.

Não é só no pós-tratamento que o apoio psicológico é importante. Ele deve ser feito desde o diagnóstico, e pacientes com a doença mais avançada também devem buscar o apoio de um profissional. “Tudo muda no segundo em que o médico confirma a doença: pensamentos e sentimentos invadem a mente e a alma. O suporte psicológico ajuda o paciente a elaborar as ideias e dá ferramentas para que ele crie novas estratégias, adaptando-o para o futuro. Cada paciente tem sua história de vida. O psicólogo individualiza a abordagem e trabalha em cima das peculiaridades de cada um”, explica Rosely Yamamura.

O câncer mudou a vida da jornalista Anne Warth. Durante o tratamento, ela diminuiu o ritmo de trabalho e se afastou dele em alguns momentos. Hoje, todas suas atividades já foram retomadas, mas com ritmos e valores diferentes. “Quando você passa por uma situação como essa, a vida não pode se resumir a isso, mas também não pode voltar a ser o que era antes. As coisas têm significado. Talvez eu nunca saiba por que isso aconteceu comigo, mas espero que isso me ensine a ver as coisas com um olhar mais carinhoso em relação à vida, ao mundo, as pessoas”, diz.

Estudos sobre impacto do acompanhamento psicológico

O impacto do acompanhamento psicológico em pacientes com câncer e em pessoas que tiveram a doença é tema de vários estudos. No encontro anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO 2017), foram apresentados resultados de três análises.

Um dos estudos foi feito com pessoas que passaram por tratamento de câncer de mama, de intestino e melanoma e estavam livres da doença. Elas fizeram cinco sessões de terapia os resultados mostraram que a intervenção psicológica reduziu significativamente o medo de recidiva do câncer, houve melhora na qualidade de vida e diminuição da ansiedade e angústia.

O segundo estudo, feito com pacientes que tiveram diagnósticos recentes e iniciaram o tratamento oncológico, mostrou que o programa de apoio psicológico melhorou a qualidade de vida dos pacientes e reduziu os níveis de sofrimento.

O terceiro avaliou o impacto do apoio psicológico em pacientes com câncer em fases mais avançadas. Naqueles que tinham sintomas depressivos, houve redução dos mesmos. E nos que não tinham sintomas depressivos, houve diminuição da incidência de depressão.

“Em conjunto, todos esses estudos mostram que o tratamento do paciente com câncer deve ser global e precisa de uma equipe multidisciplinar para de fato ser completo. O tratamento de suporte, que ajuda no controle de sintomas e melhora a qualidade de vida, é valioso e deve ser uma das prioridades no manejo do câncer”, enfatiza a oncologista Rosely Yamamura.

Logotipo do Instituto Vencer o Câncer

O Instituto Vencer o Câncer é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), fundada pelos oncologistas Dr. Antonio Carlos Buzaid e Dr. Fernando Cotait Maluf, com atuação em 3 pilares: (1) Informação de excelência e educação para prevenção do câncer. (2) Implementação de centros de pesquisa clínica para a descoberta de novos medicamentos. (3) Articulação para promoção de políticas públicas em prol da melhoria e ampliação do acesso à prevenção, ao tratamento e à cura do câncer.

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