“Cada paciente é única”
Depois do diagnóstico de câncer de mama, algumas mulheres começam a quimioterapia, outras não precisam de tratamento quimioterápico; algumas pacientes fazem primeiro uma cirurgia; outras não; algumas iniciam a imunoterapia, outras, não precisam. “Esse padrão de tratamento diverso reflete o quanto a doença é diversa”, alerta a oncologista Debora Gagliato, membro do Comitê Científico do Instituto Vencer o Câncer. Os avanços na medicina possibilitam saber que os tons do Outubro Rosa são bastante variados, o que implica em um olhar mais amplo para esse tipo de tumor. “É uma doença muito heterogênea. Não tem só um tipo de câncer de mama. Existem pelo menos três grandes grupos, que envolvem diagnósticos, estratégias e tratamentos diferentes, considerando desde subtipos até o quanto a doença está avançada localmente na axila, a comorbidade da paciente, se tem contraindicação ao tratamento”.
A diversidade também reforça quanto cada paciente é única e precisa ser observada com atenção individualizada, fruto de uma boa relação médico-paciente, que vai ajudar a obter melhores resultados. Debora Gagliato comenta que essa relação é fundamental na cura e recuperação da paciente, pois envolve desde confiar, do ponto de vista científico, que o médico está apto e é especialista no assunto, conhecendo as melhores opções de tratamento, e também do ponto de vista técnico, envolvendo a equipe. “O médico precisa se colocar na posição de estar junto da paciente, demonstrar que está na briga com ela, ficar acessível e muitas vezes um telefonema não será apenas para discutir uma intercorrência médica, mas para uma palavra de força, apoio profissional”, diz. “Quando a equipe está disponível e uma eventual intercorrência já é tratada no início, impede que tome proporções grandes que podem interferir no tratamento”.
A oncologista chama atenção para outro aspecto essencial na jornada da paciente, que é um bom respaldo da família e amigos, destacando a importância dessa rede de apoio e de como o posicionamento de sempre querer fazer tudo sozinha pode ser prejudicial. “Mesmo que a mulher esteja forte, receba todas as medicações para contemplar os efeitos que o tratamento provoca, poderá estar mais cansada em alguns dias, às vezes precisará ir muito ao hospital. Por isso é necessário ter ajuda, seja para preparar a refeição para um filho enquanto está no tratamento, arrumar a casa, acompanhá-la quando for ao hospital e estiver sonolenta ou mesmo quando estiver em casa e não se sentir bem. Ter essa rede de apoio não é um luxo; é uma necessidade para todas as mulheres, independentemente da idade, condição social e tipo de tratamento”.
Ela reforça que o auxílio pode vir de variadas formas, mesmo que seja apenas ouvir um desabafo ou compartilhar carinho. E esse apoio pode influenciar inclusive no diagnóstico, já que é importante comparecer aos compromissos do tratamento para aumentar a chance de cura e garantir melhores resultados. “Até o estado de humor melhora, porque quando a paciente tem esse auxílio pode descansar, fica mais serena, mais forte e isso se reflete no próprio sistema imune e no bem-estar mental”.
Diagnóstico e tratamentos
Os exames de rotina são imprescindíveis para diagnosticar precocemente o câncer de mama e aumentar as chances de cura desse tumor que, com exceção do câncer de pele não melanoma, é o mais incidente em mulheres em todas as regiões do Brasil – com destaque para Sul e Sudeste com as taxas mais altas. A estimativa do Instituto Nacional de Câncer (INCA) para 2022 é de 66.280 novos casos, equivalente a 43,74 casos por 100 mil mulheres.
Entretanto, mesmo realizando exames todos os anos, a doença pode aparecer em estágio avançado, com tumores de intervalo, entre uma mamografia e outra, por exemplo. Por isso, Debora Gagliato ressalta que a mulher deve se conhecer, fazer o autoexame, que é a avaliação mensal da glândula mamária, observando atentamente qualquer alteração. “Se a mulher percebe um nódulo meses após ter feito a mamografia, não é porque fez o exame que não precisa procurar ajuda. Deve ir a um médico antes do tempo previsto para retorno e avaliar do que se trata o nódulo.
Sobre os novos tratamentos, a oncologista aponta novidades, especialmente em tratamentos-alvo, medicações inteligentes que bloqueiam determinados alvos, como vacinas que são conjugadas à quimioterapia. “Há medicamentos para pacientes com tumores hormonais de mais alto risco, remédios alvo que previnem a recidiva do câncer de mama, medicamentos para prevenir recidiva em pacientes com mutações, entre outros. Por isso, ter informação é fundamental e toda equipe precisa saber tudo que acontece para oferecer o melhor às pacientes”.
Cada mulher é única
Desde o momento do diagnóstico não são poucos os desafios enfrentados pelas pacientes de câncer de mama. Mas nessa jornada há também muito aprendizado e momentos inesquecíveis que constroem essas novas histórias, como as das pacientes que compartilham neste Outubro Rosa importantes lições para inspirar outras tantas mulheres.
Para saber mais, o Instituto Vencer o Câncer acaba de lançar a terceira edição do livro Vencer o Câncer de Mama. De autoria dos fundadores do Instituto, Dr. Antonio Buzaid, Dr. Fernando Maluf e da Dra. Débora Gagliato, a publicação pode ser baixada gratuitamente neste link.
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Sandra Gonçalves
Diagnóstico: câncer de mama metastático.
Tratamento atual: Tratando o quarto diagnóstico com Xeloda e o câncer de ossos com Zometa.
Quando teve o diagnóstico: 2013
Maior desafio: Lidar com as pessoas negativas
Maior medo: Mostrar paras minhas filhas que estava tudo bem e que o câncer não vai me derrubar.
Um momento inesquecível: A notícia que meu primeiro netinho estava a caminho.
Um apoio que foi fundamental: O da minha oncologista, Drª Samira Belloni.
O que fez toda a diferença: A minha postura frente ao diagnóstico.
O que faria diferente: Eu faria tudo exatamente igual.
Maior aprendizado: Eu só tenho hoje!
Principal transformação: Apaixonar-me por mim mesma.
Uma grande alegria: Aprender a me olhar e amar a mulher em mim.
Me tornar quem sou.
Uma palavra: Autocuidado
Mensagem para outras pacientes: Respira, menina!
Fernanda Pires
Diagnóstico: câncer de mama HER2 positivo.
Tratamento atual: Trastuzumabe e Pertuzumabe por infusão a cada 21 dias, para manter a doença controlada.
Quando teve o diagnóstico: Recebi o diagnóstico em outubro de 2016 após realizar os exames de admissão para o concurso da Prefeitura de São Paulo.
Maior desafio: Foi um período difícil tanto para receber o diagnóstico como para me reconhecer no meu próprio corpo após a realização da mastectomia. Ao procurar sutiã nas lojas convencionais de departamento feminino eu me sentia excluída por não encontrar o sutiã adequado para mulheres mastectomizadas. Ao ficar careca e depois ter cabelo, me olhava no espelho e não me reconhecia, pois tinha três versões: a Fernanda de antes, durante e depois do tratamento, que aos poucos foi aprendendo a viver esse período de transformação.
Maior medo: Morrer e não acompanhar o crescimento do meu filho que naquele período estava com 10 anos.
Um momento inesquecível: Hoje faço o possível para estar presente em todos os momentos ao lado dele, para que possamos criar as nossas memórias
Um apoio que foi fundamental: A minha família é o meu porto seguro, sempre esteve presente nos momentos que precisei ser cuidada, choramos e vibramos juntos em todos os tempos.
O que fez toda a diferença: Essa presença fez a diferença, porque me sentia fortalecida com tanto amor e dedicação, mesmo nos dias mais difíceis não pensei em desistir.
O que faria diferente: Procuraria resolver as adversidades do cotidiano com mais calma e não no impulso, pois ficava nervosa com frequência porque queria ter o controle de tudo em todos os tempos.
Maior aprendizado: Após o diagnóstico percebi que levava uma vida acelerada e precisava mudar muitas coisas.
Principal transformação: As mudanças mais significativas foram a redução do horário de trabalho, criar e aproveitar os bons momentos ao lado das pessoas que eu amo. Isso me permitiu ver e viver as coisas mais importantes da vida.
Uma grande alegria: É difícil hoje dizer o que me deixa mais feliz, pois todos os momentos têm um significado especial, mas ver o meu filho crescer e estar em família deixa meu coração cheio de alegria, pois a minha família é um presente divino.
Uma palavra: Hoje posso dizer que a palavra ESPERANÇA me representa, porque ela se renova a cada amanhecer e com ela uma nova vida, em um novo dia.
Mensagem para outras pacientes: Com frequência encontro pessoas que estão iniciando o tratamento, falo para elas que “o diagnóstico não nos define, somos seres que podemos fazer as nossas escolhas e viver com intensidade, pois a vida nos pertence”.
Vilma Kano
Diagnóstico: Câncer de mama Her2 positivo.
Tratamento atual: Fiz protocolo cleópatra e atualmente faço terapia alvo – Trastuzumabe e Pertuzumabe.
Quando teve o diagnóstico: Em 2012 e 2017.
Maior desafio: Enterrar minha mãe por câncer de mama e iniciar o meu tratamento metastático 6 dias depois.
Maior medo: Ficar acamada.
Um momento inesquecível: O enterro da minha mãe.
Um apoio que foi fundamental: Das minhas voluntárias (ONG Vilma Kano).
O que fez toda a diferença: Meu trabalho na minha ONG.
O que faria diferente: Dedicaria mais tempo para mim mesma.
Maior aprendizado: Amor próprio.
Principal transformação: A carequinha .
Uma grande alegria: Minha ONG não parou com o meu tratamento.
Uma palavra: Resistência.
Mensagem para outras pacientes: O caminho é difícil, mas a paisagem é linda!
Maria Paula Bandeira
Diagnóstico: Câncer de mama metastático Her2 positivo.
Tratamento atual: Quimioterapia com trastuzumab deruxtecan.
Quando teve o diagnóstico: Câncer de mama localizado em 2011 e câncer de mama metastático em 2016.
Maior desafio: “adaptar” a rotina oncológica à rotina de uma jovem de 24 anos, recém-casada.
Maior medo: Ter dor.
Um momento inesquecível: O primeiro PET zerado.
Um apoio que foi fundamental: O apoio do meu marido, Rodrigo. Na verdade, tem sido essencial esse companheirismo.
O que fez toda a diferença: Tentar viver o momento presente, sem antecipar lutos.
O que faria diferente: Ter vivido o câncer de mama localizado como um período que não exigia o meu eu inteiro. Como se eu estivesse numa arquibancada vendo a vida das pessoas acontecer enquanto eu aguardava o fim do tratamento e fazia o que me cabia.
Maior aprendizado: A vida está acontecendo, não para e não aguarda.
Principal transformação: Ter como prioridade a qualidade de vida, dure o quanto durar.
Uma grande alegria: O nascimento do meu afilhado.
Uma palavra: Felicidade.
Mensagem para outras pacientes: A gente passa por muitos lutos (cabelos, órgãos, planos etc), mas o que vivemos faz parte da nossa história e necessita do nosso melhor, mesmo que o melhor seja ficar deitado. Não significa ser irresponsável, mas dançar conforme a música!
Priscila de Jesus
Diagnóstico: câncer de mama-carcinoma ductal invasivo, grau 3, receptor hormonal.
Tratamento atual: hormonioterapia.
Quando teve o diagnóstico: 2019.
Maior desafio: Debilidade física.
Maior medo: Não ter a oportunidade de realizar alguns sonhos.
Um momento inesquecível: Uma tarde com minhas amigas, que faziam rodízio para não me deixar sozinha. Comemos cachorro-quente e conversamos sobre o futuro.
Um apoio que foi fundamental: Minha família que estava presente a todo momento.
O que fez toda a diferença: Minha grande rede de apoio.
O que faria diferente: Tiraria muito mais fotos dos momentos.
Maior aprendizado: A importância do autocuidado e como somos uma rede física e emocional tão grande.
Principal transformação: Um novo olhar do que era a vida e o quanto e o tanto que eu quero viver. Uma renovação de focos, prioridades e crenças.
Uma grande alegria: Perceber como minha história impactou e inspirou tantas pessoas.
Uma palavra: Fé.
Mensagem para outras pacientes: Receber o diagnóstico e passar pelo tratamento é difícil. São mares de questionamentos, aprendizados, dores, amores e alívios. Sua rede de apoio será muito importante, assim como sua fé. Acredite sempre no melhor e tenha certeza de que tudo passa!
Susana Bragatto
Diagnóstico: câncer de mama hormonal, PR e EST positivo, luminal Ib, grau III. Sentinelas negativos. Mammaprint high risk.
Tratamento atual: tamoxifeno. Cheguei a injetar zoladex por um tempo também, mas fiquei tão loka que pedi pra dar um tempo. Além disso, fiz lumpectomia, 6 meses de quimioterapia, radioterapia e braquiterapia.
Quando teve o diagnóstico: 5 de outubro de 2017.
Maior desafio: minha cabeça.
Maior medo: que o medo me paralise. Medo a gente tem; do bicho, de não ter, de não ser, do dia de amanhã. Quando eu fico muito obcecada com algum pensamento, por exemplo, sobre a possibilidade de o câncer voltar – e, claro, isso é um tópico, acredito, top #3 na cabeça de qualquer paciente em remissão –, tiro os sapatos, piso na terra, caminho entre árvores, medito, penso em ajudar alguém, me conectar com o entorno. A vida é bem maior, e eu “tô” aqui que nem as “fôinhas” dos galhos, os passarinhos em migração, tu e outrem: passageira dos tempos.
Um momento inesquecível: o diagnóstico. Cortar o cabelo, antecipando que ia cair tudo. Sair careca na rua, botar peruca, entrar no Tinder durante a quimio, terminar a quimio, ir à praia e sentir os primeiros pelinhos da cabeça balouçando com a brisa…
Um apoio que foi fundamental: gente que eu nem imaginava que poderia estar do meu lado. Passei pela doença e fiz o tratamento longe da família, por mil motivos, em Barcelona, onde vivo até hoje. Amigos me ajudaram com uma ternura incrível, foram além de seus limites afetivos, dormindo comigo, me acompanhando a sessões de quimio, trazendo comida, apoiando meu choro, respeitando meus momentos. Que difícil é estar do lado de alguém passando por um câncer. Olé a todos. Com cada um aprendi muito.
O que fez toda a diferença: minha cabeça.
O que faria diferente: Não teria corrido à praia logo depois da quimioterapia pra pegar um bronzeado – o médico me avisou que um dos efeitos secundários do taxol poderia ser fotossensibilidade. Tive uma alergia solar danada e, depois, fiquei com umas manchinhas indeléveis na cara. Faria diferente, mas não me arrependo.
Maior aprendizado: são tantos, e ainda em curso.
Aprendi a soltar mais. O dia de amanhã nunca vai chegar.
O câncer me ensinou a ser (um pouco – ainda estou no processo…!) mais amável comigo mesma, e também a olhar pra além do meu umbigo.
Perco o medo da morte quando me sinto conectada com meu entorno – a natureza, as pessoas, o bem-estar coletivo. Transformei este último em meu objetivo de vida, e comecei a estudar uma nova carreira na área de saúde. Meu desejo é combiná-la com minha formação jornalística e difundir informação sobre a área, histórias de vida e inspiração.
Como paciente, sinto falta de mais conteúdos humanos que contemplem profundamente e de maneira experiencial temas caros a todos nós, e ainda mais a um paciente de câncer – morte, sexo, autoestima, depressão, pânico, trauma.
Principal transformação: Tantas. Nunca a expressão “vão-se os anéis…” fez tanto sentido.
Uma grande alegria: Viver. Estar aqui, agora mesmo. Às vezes ainda esqueço – mas cada momento é um feliz milagre.
Uma palavra: Confiança.
Mensagem para outras pacientes: Gosto de pensar que morrer é apenas um segundo – viver são todos os demais.
Crédito das fotos Susana Bragatto: Raül Cendón
O Instituto Vencer o Câncer é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), fundada pelos oncologistas Dr. Antonio Carlos Buzaid e Dr. Fernando Cotait Maluf, com atuação em 3 pilares: (1) Informação de excelência e educação para prevenção do câncer. (2) Implementação de centros de pesquisa clínica para a descoberta de novos medicamentos. (3) Articulação para promoção de políticas públicas em prol da melhoria e ampliação do acesso à prevenção, ao tratamento e à cura do câncer.