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Cuidar da pele é um hábito que deve começar desde a infância

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Evento do Dezembro Laranja, realizado pelo Instituto Vencer o Câncer, abordou também as inovações em tratamento para o câncer de pele.

 

“A nossa saúde é uma só e envolve proteção cardiovascular, da pele, de tudo. Não podemos focar em uma coisa e esquecer outra”. Com esse conceito, o oncologista Rafael Schmerling, membro do Comitê Científico do Instituto Vencer o Câncer (IVOC) e presidente do Grupo Brasileiro de Melanoma, falou sobre cuidados para prevenir, diagnosticar precocemente e tratar o câncer de pele, junto com Elimar Gomes, dermatologista e coordenador da campanha Dezembro Laranja da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD). Ambos participaram do evento online Dezembro Laranja realizado pelo IVOC, com mediação da jornalista Natalia Cuminale e apresentação de boas-vindas de Antonio Buzaid, um dos fundadores do Instituto. 

O lema da campanha do IVOC é “Seja amigo do sol e da sua pele”. Schmerling comentou que há dez anos a Oncologia clínica não tinha muito a oferecer para a maioria dos pacientes, mas que por mais que os tratamentos tenham avançado, a essência da campanha é a prevenção e o diagnóstico precoce, para que as pessoas se cuidem melhor. “É possível ser amigo do sol e se proteger. O sol vai participar da nossa vida como uma coisa boa, a vitamina D faz bem, melhora o humor; ele é bom, mas precisa ser encarado com responsabilidade, compreendendo os riscos reais e tomando cuidados”, afirma o oncologista.

Um vídeo com depoimento da veterinária Tânia Conservani, 38 anos, demonstrou as possibilidades atuais de tratamento. Ela foi diagnosticada com melanoma grau 4 aos 32 anos. “Foi o primeiro caso de melanoma na família; já havia outros tipos de câncer, inclusive de pele, mas não melanoma”. Depois da remoção da pinta e de uma tomografia, foi encaminhada a um oncologista que recomendou ampliação da margem cirúrgica e exame de linfonodo sentinela. “Tive diagnóstico de metástase no fígado, foi outro baque, outro choque. O médico chegou a falar que não tinha tratamento que compensasse, meio que me condenou à morte”, recorda emocionada.

Em consulta com outro oncologista começou tratamento, que teve início com quimioterapia e imunoterapia. O medicamento imunoterápico apresentou bastante efeitos colaterais, como irritação na pele, hipofisite (doença inflamatória da hipófise) e dor de cabeça constante por dois anos. Quando o organismo parou de reagir ao imunoterápico, o tumor no fígado cresceu, chegando a ter 10 centímetros.

Ela passou a tomar outro medicamento e no meio do processo engravidou da sua terceira filha. Foram meses difíceis, uma gravidez de risco que exigiu repouso e suspensão do tratamento. Depois do parto, o temor era saber o que havia ocorrido com o tumor depois de sete meses sem tratamento nem acompanhamento de tomografia. A boa notícia foi descobrir que tinha reduzido para 3.6 centímetros e Tânia pode seguir com os tratamentos e levar uma vida feliz com a família.

 

Prevenção é o melhor caminho

O dermatologista Elimar Gomes destaca que esse tipo de tumor é resultado de uma confluência de diversos fatores pessoais, como o tom da pele e nível de exposição ambiental. Pessoas com pele clara, olhos claros, cabelos ruivos ou loiros têm risco aumentado, também quem tem histórico familiar deste tumor ou teve episódios de queimadura por exposição solar na infância. Gomes lembra que o dano provocado pelo sol é cumulativo.

Por isso, a melhor forma de prevenção é estabelecer desde cedo o hábito de reduzir a exposição ao sol. “Mesmo quem teve muita exposição na infância, quando passa a se cuidar na idade adulta, reduz os riscos. A prevenção precisa de estratégia de curto e longo prazo”.

Antes de detalhar a forma correta de usar o protetor solar para ter uma proteção efetiva, Gomes chama atenção ao fato de que ele não é o salvador da pátria e que as pessoas podem se sentir seguras passando o produto e se expor mais ao sol. “Quantas vezes vemos pessoas dizendo que compraram protetor e não acabou durante a viagem?”, cita como exemplo de que as pessoas costumam utilizar uma quantidade menor do que é necessária.

Para conseguir efeito protetor, esclarece, deve-se usar com fator acima de 30. “Quando se usa um protetor com fator 30, para conseguir esse índice de proteção é preciso passar 2 gramas por centímetro quadrado de pele; uma colher de chá é o equivalente necessário para o rosto”, conta. “A pessoa deve seguir as regras de quantidade ou fazer dupla aplicação: passa no corpo inteiro ainda em casa e quando chega na praia faz outra camada. Assim fica próximo da proteção oferecida na embalagem”.

Outra sugestão para garantir maior proteção é utilizar produtos com fatores acima de 70 e 80, perto de 100. Segundo o dermatologista, é uma forma de corrigir um pouco o erro na aplicação do produto. “Quando passo metade da dose recomendada do protetor com fator 30, não estou com proteção 15, mas com 7 ou 8. Se usar fator 100, a metade pode ter uma proteção que chegue perto de 50”.

Ele explica ainda que a proteção UVA representa um terço da UVB, que é o fator apresentado na embalagem; ou seja, um protetor fator 60 tem proteção UVA de 20.

Uma questão importante a se considerar é lembrar que os protetores solares se degradam ao sol – em duas horas perdem muito da proteção e precisam ser repassados. Apesar de apresentarem boa resistência à água, ela tira bastante da proteção e por isso é preciso reaplicar quando sai da água ou depois de suar muito, como na prática de atividade física.

“Com essas medidas, o protetor solar é útil na redução do risco do câncer de pele, mas não temos só ele, que pode ser caro. Sombra é de graça. O sol das 9 às 15 horas tem índice de radiação extremamente alto, nem com uso de protetor vale ficar exposto. Deve-se ficar embaixo do guarda-sol e mesmo assim aplicar o produto, para se proteger dos raios que refletem na areia”, acrescenta Gomes.

As roupas com proteção ultravioleta também ajudam na prevenção, mas como o sol atravessa a água, na hora de se banhar, se tirar a roupa é preciso usar protetor. “Com esse conjunto de medidas de fotoproteção desde a infância, conseguimos prevenir o tumor. Essas medidas precisam virar hábitos, e hábito se adquire na infância”, afirma, fazendo um alerta. “Ainda temos no Brasil câmaras de bronzeamento, apesar de ser proibido. Esses aparelhos aumentam o risco do câncer de pele de forma intensa”.

 

De olho para fazer diagnóstico precoce

“Para todo tumor, quanto mais precoce identificar e tratar, melhor será a chance de cura, e com o melanoma não é diferente”, alerta Schmerling. Para avaliar o risco do melanoma, explica, é considerada sua profundidade. “À medida que cresce e se aprofunda, temos índices 1, 2, 3 e 4; é medido em milímetros. O patologista, médico que faz a biópsia, nos traz essa informação para definirmos o tratamento. Quando a doença é precoce, conseguimos restringir à cirurgia, por exemplo. No caso da doença avançada, serão necessários mais exames para avaliar tratamentos adicionais”. 

O diagnóstico precoce evita que o tumor se aprofunde, diminuindo as chances de produzir metástase. Os cuidados, pondera Gomes, devem considerar os fatores: pessoas que se enquadram no risco aumentado precisam ter acompanhamento mesmo sem sintoma, com avaliação dermatológica de todas as pintas.

Uma recomendação a todos, independentemente do nível de risco, é ficar de olho nos sinais de alerta: se aparecem novas pintas, se as que existem têm crescimento progressivo, formato assimétrico, lados diferentes, bordas irregulares, múltiplas cores ou crescimento rápido. Esses são sinais de alerta para melanoma, tipo mais agressivo de câncer de pele. As pintas comuns, diz o dermatologista, são geralmente arredondadas, simétricas, têm somente uma cor e crescem lenta e uniformemente.

Nos tumores de pele não melanoma, chamados carcinomas basocelulares (representam 70% dos casos) e espinocelulares (10%), o diagnóstico precoce também faz diferença e salva vidas, porque eles podem se aprofundar e invadir camadas mais profundas da pele. Apesar do crescimento mais lento, podem ser agressivos. Como exemplo, Gomes cita uma lesão, ainda que pequena, na ponta do nariz, em que a cirurgia pode deixar sequelas. 

Como sinal de alerta para identificar o tipo basocelular, diz que pode aparecer como uma bolinha um pouco brilhante em que às vezes é possível ver as veias, ou com uma cicatriz que começa a crescer em um local em que não havia nada. Já para o espinocelular é bom ficar atento a feridas que demoram a cicatrizar, mais de 4 a 6 semanas, além de verrugas avermelhadas dolorosas e de crescimento agressivo. Em caso de qualquer suspeita, o ideal é logo procurar um dermatologista para fazer o diagnóstico.

O médico fará primeiro um exame visual, para depois examinar cada pinta com o dermatoscópio – que é uma lente de aumento com luz que separa as cores das pintas, possibilitando ver lesões suspeitas em seu estado inicial. 

Os exames preventivos também seguem esses cuidados. Para quem tem uma quantidade muito grande de pintas é usada a técnica do mapeamento corporal total e a dermatoscopia digital, em que é feita foto do corpo inteiro do paciente e depois, com o dermatoscópio no sistema digital, são registradas imagens de cada lesão. Periodicamente o processo é repetido para avaliar as mudanças ocorridas, algumas são benignas e outras, ainda que discretas, podem representar um tumor, que deve ser retirado. Esse acompanhamento é uma forma de diagnosticar precocemente e evitar a retirada desnecessária de muitas pintas.

“Há ainda exames como a microscopia confocal, em que um aparelho de laser faz leitura de camadas da célula e ajuda a identificar se uma lesão é suspeita e sua graduação, o que auxilia na determinação do tratamento”, avisa o dermatologista. Um ponto importante é o paciente que teve câncer de pele seguir com acompanhamento dermatológico para verificar caso ocorram novas lesões.

Nas famílias em que muitas pessoas desenvolvem melanoma, algumas com idade inferior a 30 anos, um geneticista poderá ajudar com aconselhamento familiar para prevenir próximos casos.

 

Tratamentos têm mais opções

O principal tratamento para o melanoma, conta o oncologista, é a cirurgia. Depois a biópsia vai ajudar a definir os próprios passos. “Dependendo da profundidade do tumor, fazemos um procedimento chamado pesquisa do gânglio sentinela. O cirurgião injeta uma substância que vai marcar o gânglio – se for no braço, por exemplo, injeta na axila; se na perna, coloca na virilha. Com isso identificamos se ocorreu espalhamento para os gânglios e, se houver, qual o primeiro a ser comprometido. Quando acontece esse comprometimento, há um risco maior da doença voltar”.

Quando o risco é alto, o médico pode optar por um tratamento adjuvante, complementar à cirurgia, que conta com duas estratégias: imunoterapia e terapia-alvo.

A imunoterapia não ataca diretamente o câncer; ela tenta ensinar o sistema imune a atacar o tumor. Schmerling explica que em teoria o sistema imune reconhece tudo que não nos pertence, mas precisa reconhecer o que pertence. “Como se fosse um porteiro, porque o organismo não pode atacar nossas células ou a comida que ingerimos. Não pode atacar o que é importante e tem que defender do que nos agride. O tumor nasce a partir de células que são nossas e, de certa forma, consegue enganar o sistema imune porque tem várias das nossas características genéticas”, afirma. “Os remédios mais modernos são usados para deixar o sistema imune mais alerta, percebendo o tumor para agredi-lo”.

A terapia-alvo é utilizada quando o paciente tem o gene BRAF alterado. Conforme o oncologista, as mutações são como engrenagens de um relógio – na maioria dos tumores é preciso ter várias doentes para formar um câncer. Entretanto, às vezes apenas uma destas alterada basta. Isso acontece em alguns casos de melanoma – 40% têm alterado um gene do tumor, chamado BRAF. “Quando o paciente está doente, essa engrenagem gira enlouquecidamente. A terapia-alvo bloqueia essa engrenagem para o tumor entrar em colapso”.

Sobre a cirurgia para carcinomas basocelular e espinocelular, Gomes diz que há técnicas que ajudam a ter certeza de que o tumor foi retirado por completo, como a cirurgia micrográfica de Mohs, com o conceito de margem de segurança: é feita a retirada de um pedaço pequeno da pele do paciente, que passa por congelamento e é analisado no microscópio. “Permite identificar para onde o tumor está indo e garante a remoção por completo, sem necessitar exagero na retirada da pele, além de reduzir a chance de o tumor voltar”.

Nos casos em que o paciente não pode se submeter à cirurgia, ou porque está frágil, não pode ser anestesiado, ou porque o procedimento seria bastante mutilante, o dermatologista revela que há outras estratégias, como a radioterapia ou, ainda, tratamentos tópicos, cremes aplicados no tumor que fazem processo semelhante à imunoterapia, ativando a imunidade no local para que o corpo consiga destruir o tumor. “A opção por esses tratamentos precisa ser bem avaliada e o paciente estar ciente dos riscos, porque não atingem índices de cura tão altos quanto a cirurgia.  Além disso, se não for feito da forma correta, pode tratar a superfície da pele e o tumor continuar crescendo na profundidade, deixando de fazer o tratamento da lesão no momento certo”.

Nos casos mais graves de carcinomas basocelulares, quando a cirurgia não vai ajudar e em regiões que podem comprometer órgãos, como invadir o crânio, por exemplo, Schmerling acrescenta que há medicamentos como terapia-alvo e começam a surgir dados de imunoterapia para alguns casos. Para o espinocelular, há drogas aprovadas para doenças avançadas ou metastáticas, ou para quando a cirurgia seria mutilante ou o paciente não tem condições de fazer. 

“Infelizmente não temos incorporação definitiva de nenhuma dessas drogas mais modernas no SUS. Temos um medicamento oral para o qual a agência deveria dar o aval, mas ainda não deu; nesse caso, nem pelo convênio o paciente consegue rotineiramente, apesar de já estar aprovado pela Anvisa”, lamenta. O Instituto Vencer o Câncer tem uma campanha chamada Sim para quimio oral que reivindica a liberação desse tipo de medicação. ”Para melanomas temos apenas no cenário privado. Houve neste ano um movimento grande no sentido de incorporar no SUS imunoterapia e terapia-alvo para melanoma metastático, o Conitec, órgão do Ministério da Saúde responsável pela decisão da incorporação de medicamentos, deu parecer favorável, mas ainda não se concretizou”.

 

Nenhum melanoma é igual ao outro. Saiba mais sobre a mutação BRAF e a importância de conhecer as características genéticas do tumor.

Logotipo do Instituto Vencer o Câncer

O Instituto Vencer o Câncer é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), fundada pelos oncologistas Dr. Antonio Carlos Buzaid e Dr. Fernando Cotait Maluf, com atuação em 3 pilares: (1) Informação de excelência e educação para prevenção do câncer. (2) Implementação de centros de pesquisa clínica para a descoberta de novos medicamentos. (3) Articulação para promoção de políticas públicas em prol da melhoria e ampliação do acesso à prevenção, ao tratamento e à cura do câncer.

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