Gisele Vieira
Nutricionista oncológica especialista
Instituto Ana Baccarin – Oncologia e qualidade de vida
Comitê científico – Instituto Vencer o Câncer
Após o tratamento oncológico, pacientes frequentemente têm dúvidas e medos sobre alimentação. Em geral, questionam sobre qual é a melhor forma de realizar a prevenção oncológica de seguimento e o que pode ajudar o surgimento de novos tumores ou recidivas.
O seguimento é uma parte importante do tratamento oncológico, em que o principal objetivo é o equilíbrio de funções vitais do metabolismo como: consumo de nutrientes essenciais, ação anti-inflamatória e antioxidante, controle de gordura corporal, manutenção da microbiota intestinal e absorção de nutrientes.
Desta forma, a principal dúvida é sobre a escolha da melhor dieta que o paciente deve seguir. A resposta é que não há uma dieta perfeita para esta ação, mas sim um estilo de vida e alimentos que podem ser aliados após o tratamento oncológico.
A Dieta do Mediterrâneo, com certeza, engloba diversos pontos importantes e nutrientes essenciais da alimentação, além de possuir as maiores evidências científicas para a prevenção oncológica. Ela também é citada como um estilo de vida, baseada em consumo de alimentos in natura, de baixo teor de gorduras animais, açúcares, na redução de consumo de farinhas refinadas, carne vermelha, embutidos e rica em alimentos como azeite, frutas, verduras, legumes e cereais integrais.
Outro ponto importante desta dieta é a sua base, com ênfase a atividades física regulares, preparo de alimentos nos lares, o que evidencia a importância de alimentos in natura, e a hidratação com atenção ao consumo diário de água.
Fonte: Fundação Dieta Mediterrânea
Outra evidência mais recente e discutida na atualidade é a Dieta Plant Based, baseada em vegetais. Possui indícios de que pode contribuir positivamente para o controle de funções metabólicas essenciais, como controle glicêmico, de fatores inflamatórios, alto consumo de substâncias anti-inflamatórias e compostos bioativos.
A dieta baseada em plantas não tem níveis precisos de consumo de alimentos de origem animal em detrimento do vegetal, mas a maioria dos estudos mostra benefícios de ação antitumoral quando estas dietas se baseiam em média de 80% ou mais da dieta baseada em vegetais.
Importante lembrar que este plano alimentar deve ser avaliado por nutricionista oncológico e oncologista, pois há contraindicações de seu uso indiscriminado – como exemplo pacientes com perda de peso severa durante o tratamento oncológico, ou presença de sarcopenia (baixa funcionalidade da massa muscular ou perda de massa muscular) bem como portadores de caquexia (perda ponderal extensa, comprometendo funções metabólicas).
E, de acordo com cada caso, o complemento nutricional pode ajudar. Vale ressaltar que a alimentação deve seguir como algo prazeroso e adequada às necessidades de cada pessoa. Afinal de contas, quem disse que não pode comer tapioca ou ovos?
Outro ponto positivo para o paciente em seguimento é a redução do consumo de alimentos processados e ultraprocessados, carne vermelha e embutidos: já é comprovado que o alto consumo destes alimentos está atrelado a maiores índices de surgimento de diversos tipos de tumores, bem como maior teor de substâncias inflamatórias em nossa dieta, com repercussão negativa em diversos órgãos e sistemas.
A manutenção da microbiota intestinal também é ponto crucial para esta fase do tratamento: diversas evidências mostram sua fundamental importância para o seguimento oncológicio. A microbiota engloba os micro-organismos que habitam todo o intestino, que contribuem para a manutenção de funções metabólicas, produção de substâncias anti-inflamatórias, antitumorais e que potencializam a absorção de nutrientes essenciais como vitaminas, minerais, proteínas e compostos bioativos.
O consumo de alimentos in natura, minimamente processados e orgânicos toma cada dia mais importância nas pesquisas e na ciência: os benefícios são inúmeros, desde a maior concentração de nutrientes biodisponíveis, controle de processos metabólicos e maiores teores de compostos bioativos anti-inflamatórios, antioxidantes e antitumorais ingeridos através destes alimentos.
Por outro lado, quanto maior o número de aditivos químicos, pesticidas e agrotóxicos, maior o impacto negativo nas funções da microbiota intestinal, hepática e nas funções celulares em geral.
Por isso, é importante conhecer alguns conceitos e saber como utilizar os alimentos:
* Alimentos in natura são alimentos frescos, obtidos diretamente de plantas ou de animais para o consumo sem que tenham sofrido qualquer alteração ou adição de substâncias (como conservantes, aditivos e corantes) – Ex: frutas, verduras, legumes, grãos, cereais, frango, peixe, ovos etc;
* Alimentos minimamente processados: são os alimentos que foram submetidos a algum processo, mas que não envolvam agregação de substâncias ao alimento original, como limpeza, moagem e pasteurização. Ex: arroz, feijão, lentilhas, cogumelos, frutas secas, castanhas e nozes sem sal, farinhas de mandioca, de milho de tapioca ou de trigo etc;
*Alimentos orgânicos: alimento in natura ou processado, obtido em um sistema orgânico de produção agropecuária ou oriundo de processo extrativista sustentável e não prejudicial ao ecossistema local, sem uso de agrotóxicos sintéticos, pesticidas, herbicidas e substâncias que alterem o meio ambiente.
Mas como usar estes alimentos, já que muitos têm receio do consumo de vários deles, até mesmo como incorporar a rotina alimentar após o tratamento oncológico?
Seguem, abaixo, algumas sugestões para que estes alimentos sejam incorporados na rotina:
– Azeite: o consumo de azeite fornece diversos compostos bioativos anti-inflamatórios, antitumorais e de controle do HDL (colesterol “bom”). Utilize em preparações como saladas, refogados, assados.;
– Temperos e ervas frescas/desidratadas naturais: traga para suas preparações ervas e temperos que você pode ter em sua horta em casa, em um pequeno vaso, até mesmo os adquiridos in natura ou desidratados – cebola, alho, salsinha, cebolinha, sálvia, coentro, alecrim, sálvia, pimentas, urucum/colorau e o famoso Açafrão-da-Terra (Cúrcuma ou açafrão brasileiro) que possui ação anti tumoral, anti inflamatória e participa positivamente com seus compostos bioativos na regulação de glicemia, pressão arterial, composição da microbiota intestinal, controle de gordura corporal, dentre outras milhares de funções;
– Chás: usaremos ervas frescas ou desidratadas, de procedência (sempre embalados e etiquetados pelo fabricante para garantirmos sua origem e pureza). Algumas opções são erva doce, erva cidreira, melissa, gengibre, camomila, alecrim, sálvia, cascas de frutas (abacaxi, maçã, frutas vermelhas), canela, cravo;
– Iogurte desnatado: excelente fonte de proteínas e cálcio. Utilize a versão desnatada e adicione fruta picada, aveia, chia;
– Farinhas de raízes, cereais integrais e sementes: farinha de mandioca, polvilho, aveia (farelo, farinha, flocos), farinha de castanhas, de nozes, fécula de araruta, de batata etc. Dê preferência às integrais que contêm mais fibras. Estas farinhas podem ser usadas para substituir a farinha de trigo branca em preparações como panquecas, tapioca, bolos caseiros, massas de tortas;
– Grãos: muito comum a retirada do consumo de grãos pensando em controle de peso. Porém, é uma prática errônea, uma vez que os grãos possuem proteína vegetal e fibras, além do carboidrato. Assim, são excelentes aliados à saúde hepática, intestinal e de compostos bioativos. Utilize o bom e velho feijão com o arroz integral, e no preparo de sopas, saladas, cozidos (com lentilha, ervilha, grão de bico, quinoa);
– Frango, peixes, frutos do mar e ovos: muitos pacientes deixam de consumir estas proteínas apenas por medo de recidiva do câncer. Mas as mesmas possuem benefícios quando consumidas em volume adequado a cada estado nutricional (dieta plant based pode ser indicada a pacientes com melhores índices de massa muscular, enquanto dietas com teor mais elevado de proteína de peixes, frango e ovos podem ser melhor indicadas a pacientes com baixa massa muscular, perda ponderal recente devido ao tratamento ou mesmo pós-cirurgias e procedimentos).
De forma geral, o consumo destes alimentos é uma excelente fonte de proteína, baixos em gordura e ricos em minerais. Desta forma antes de excluir algum deles ou aderir a dietas veganas, vegetarianas ou plant based, sempre procure seu nutricionista oncológico para que ele avalie suas necessidades.
A seguir, compartilho alguns passos para a prevenção oncológica, após o tratamento oncológico e seguimento, de acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA):
Fonte: INCA, 2020.
Referências:
Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Dieta, nutrição, atividade física e câncer : uma perspectiva global : um resumo do terceiro relatório de especialistas com uma perspectiva brasileira / Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. – Rio de Janeiro : INCA, 2020. 140 p. : il. color. Traduzido e adaptado de: Diet, nutrition, physical activity and cancer: a global perspective: a summary of the third expert report. ISBN 978-85-7318-385-6 (versão impressa) ISBN 978-85-7318-386-3 (versão eletrônica).
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O Instituto Vencer o Câncer é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), fundada pelos oncologistas Dr. Antonio Carlos Buzaid e Dr. Fernando Cotait Maluf, com atuação em 3 pilares: (1) Informação de excelência e educação para prevenção do câncer. (2) Implementação de centros de pesquisa clínica para a descoberta de novos medicamentos. (3) Articulação para promoção de políticas públicas em prol da melhoria e ampliação do acesso à prevenção, ao tratamento e à cura do câncer.