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Câncer de testículo: leveza e otimismo para disseminar informações sobre esse tumor com grandes chances de cura

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diego paciente

Quando o oncologista falou que se tivesse que escolher um lugar para ter câncer, seria no
testículo, Diego Menasse, 40 anos, ficou um pouco mais tranquilo. Até então enfrentava o
desespero de ter sido diagnosticado com esse tipo de tumor, aos 37 anos, quando foi ao
médico para tratar uma fimose adquirida – que acontece quando o pênis passa por inflamação
e cicatrização. “De certa forma foi engraçado, porque eu estava recém-divorciado, com uma
nova namorada – que hoje é minha esposa. Começo de relacionamento você quer ficar
namorando o tempo todo, e eu desenvolvi essa fimose adquirida”, recorda.

Depois de passar por uma consulta, o urologista ficou mais preocupado com seu testículo do
que com a fimose. “Meu testículo direito estava inchado, mas eu não sentia dor. Fiz umas
pesquisas e achei que deveria ser água”. Depois de vários exames, recebeu o resultado:
quando ouviu a palavra câncer, teve crise de ansiedade, achou que iria morrer, pensou que
não conseguiria ver a filha crescer. Saber a grande chance de cura foi o que possibilitou ter
mais tranquilidade e, durante o processo, passar a lidar com bom humor – já que além de
radialista, Diego Menasse é também humorista – e até fazer piada das situações.

Com seu jeito brincalhão, consegue trazer descontração para o tema. E é com leveza que o
Instituto Vencer o Câncer aborda o Abril Lilás, voltado à conscientização do câncer de
testículo.

O otimismo tem razão de ser: com o modelo de tratamento correto, padrão já bastante
estabelecido, 95% dos pacientes estarão vivos depois de cinco anos do diagnóstico, informa
Ana Paula Garcia, oncologista do Hospital Albert Einstein, coordenadora do tumor board de
Geniturinário do Hospital Albert Einstein, Educational Steering Committee Lacog GU e membro
do Comitê Científico do Instituto Vencer o Câncer. “É uma taxa considerada altíssima. Para
conseguir esse resultado, deve ser recomendado um centro de excelência no tratamento de
câncer, um diagnóstico precoce e metódico, com todas as etapas cumpridas da melhor
maneira possível”.

dr ana paula

Depois do susto, veio o humor, que ajuda a falar com os jovens

“Meu testículo direito ficou muito inchado. Ficou zoado? Não. Ficou incrível! Eu comprei uma
sunga branca e ficava andando pela casa com um bolão. Minha mulher falava assim: o carro do
ovo está passando na sua rua. Viu como dá para rir de câncer?”.

Esse é um dos trechos do stand-up comedy do paciente humorista, que faz a plateia gargalhar
enquanto compartilha sua experiência – e, indiretamente, ajuda a desmistificar e ampliar a
discussão sobre esse tumor que, como explica a oncologista, é o mais comum nos homens
entre 20 e 34 anos. “É importante chamar atenção porque ele afeta uma população jovem,
diferente de outros tipos, como o câncer de próstata, que é o tumor mais comum nos homens
e se desenvolve principalmente em pacientes acima de 60 anos”, avisa a especialista. “O
câncer de testículo é mais incomum, responsável por menos de 1% dos tumores masculinos,
mas acontece em uma faixa etária diferente”.

Diego Menasse conta que geralmente depois dos shows alguém da plateia o procura para
contar que teve ou conhece alguém que foi diagnosticado com câncer de testículo. “Na hora as
pessoas não falam, porque têm vergonha”.

Quando desconfiar e procurar ajuda médica

Como não tinha muita informação e não sentia dor, o paciente não se incomodou com os
sintomas. “Ficou do tamanho de uma bola de sinuca, enorme, maravilhosa. Estava legal, não
doía. Dava até um volume. Pensei: ‘deixa aí, tá maneiro, tranquilinho’. Achei que era água”.

A disseminação de informações e conscientização é fundamental porque, como ressalta Ana
Paula Garcia, o diagnóstico normalmente é feito pelo próprio paciente, na palpação do
testículo, durante o banho, por exemplo. “A maioria detecta uma massa que pode ou não ser
dolorosa; pode aparecer como um carocinho, algo mais endurecido, ou um inchaço. Por ser
um órgão bem exposto, é facilmente detectável”.

Os fatores de risco, esclarece a oncologista, são história familiar de câncer de testículo e a
história pessoal – paciente que teve de um lado tem risco aumentado para ter do outro.
“Outro fator que vemos com frequência é a criptorquidia, que é a não descida dos testículos
para a bolsa testicular. Se o bebê nasce com a bolsa escrotal vazia, o testículo fica exposto a
uma temperatura inadequada no abdômen até descer, o que pode levar muito tempo e às
vezes precisa ser colocado cirurgicamente no lugar. Essa não descida dos testículos aumenta o
risco de câncer”.

Diagnóstico é feito com retirada do nódulo suspeito

Quando o homem procura um médico após sentir algo diferente no testículo, o especialista vai
indicar um ultrassom – exame que não é invasivo e nem causa dor – para detectar se há um
nódulo. Segundo a oncologista, quando ocorre essa confirmação, há uma grande suspeita de
ser um câncer de testículo. “Normalmente não é realizada biópsia – inclusive ela não é
recomendada, especialmente através da bolsa escrotal, que é contraindicada”.

O primeiro passo é a retirada do nódulo suspeito e a partir da cirurgia e análise do material
retirado será confirmado o diagnóstico. “Depois da de orquiectomia (remoção do testículo), a
investigação pode ser complementada com tomografia – de tórax, abdômen e pelve – e
marcadores tumorais alfa-feto proteína (AFP), beta-HCG e desidrogenase láctica (DHL), que
são os principais para esse tipo de tumor”, detalha. “Com isso o médico verá a extensão da
doença, se está apenas no testículo e se o paciente tem doença nos linfonodos, especialmente
atrás da barriga e em outros órgãos, como pulmão e fígado, que é uma condição avançada”.

Ana Paula Garcia avisa que em raríssimos casos, se a doença está muito disseminada, o
paciente pode receber quimioterapia antes da cirurgia – nessas situações os marcadores
tumorais geralmente estão bastante elevados.
Como o câncer de testículo acomete principalmente pacientes jovens, apesar do testículo que
não é afetado continuar com sua função reprodutiva, normalmente é indicada a preservação

de sêmen antes do início do tratamento para homens que pretendem ter filhos. Depois da
remoção cirúrgica, em alguns casos há necessidade de quimioterapia ou radioterapia, que
podem ocasionar perda parcial da fertilidade. “É uma segurança, principalmente em se
tratando de pacientes jovens que na grande maioria dos casos irão se curar da doença”.

Tratamento padrão já estabelecido garante bons resultados

Os marcadores tumorais são colhidos antes e depois da cirurgia, para que após o
procedimento seja possível definir os próximos passos, junto com o resultado da anatomia
patológica para avaliar o risco de a doença voltar. Com essas informações e definição das
chances de recorrência os pacientes são reclassificados em risco baixo, intermediário ou alto.

Segundo a oncologista, para os pacientes de baixo risco que tenham marcadores zerados pode
ser feita apenas observação. “Já para os pacientes considerados de alto risco, mesmo com
marcadores zerados, pode ser realizado um tratamento que chamamos de complementar ou
adjuvante, com radioterapia ou quimioterapia, para reduzir a chance de recorrência”, pondera,
acrescentando que há pacientes com chances de cura diferente, como os que já têm doenças
fora do testículo, por exemplo, doença linfonodal, retroperitoneal – que é atrás da barriga,
metástases pulmonares, no fígado ou mesmo cerebral. “Mas todos têm chance de cura.
Mesmo os pacientes metastáticos têm alta chance de cura”.

Novos estudos trazem notícias promissoras

A partir da reclassificação dos riscos de a doença voltar os pacientes receberão tratamento
conforme o tipo de célula – que pode ser seminomatoso ou não seminomatoso (mistura várias
células diferentes e é um pouco mais agressivo).

A boa notícia, alerta Ana Paula Garcia, é que há avanços nesse campo. Depois que um paciente
passou pela quimioterapia ou radioterapia, repete a tomografia para saber se ainda há a
presença da doença – considerando o tamanho (acima de um centímetro no não seminoma e
maior do que três centímetros no seminoma) será preciso saber se existe doença residual ou
não.

“Você quer saber se o que aparece na tomografia é uma doença viável ou são apenas células
mortas, que chamamos de necrose tumoral. Ainda não temos como saber essa resposta e por
isso precisamos tirar o que sobrou para descobrir. Há estudos com grandes avanços que
possibilitam correlacionar a célula tumoral circulante com a presença de tumor viável e a real
necessidade de realizar essa cirurgia”, comemora. “Hoje, na dúvida, tiramos a doença que
sobrou e só depois da biópsia sabemos se precisava tirar ou era apenas necrose. Com os
avanços poderemos saber antes se o procedimento cirúrgico será ou não necessário”.

Uma jornada da tensão ao riso

Diego Menasse conta que passou por uma saga para fazer a cirurgia. Primeiro o convênio não
queria aprovar o procedimento, solicitando mais provas de que era mesmo um tumor.

Depois, teve que superar o questionamento em relação à prótese que é colocada no lugar do testículo
retirado. “Eles não queriam aprovar, dizendo que eu estava colocando uma bola de
poliuretano por estética”. A liberação só veio depois de muita briga, falando com a ouvidoria,
na véspera da cirurgia.

“A colocação da prótese é o ideal a ser feito, para que não haja prejuízo da aparência. É
realizada na maior parte dos centros de excelência de tratamento e às vezes até no Sistema
Único de Saúde (SUS)”, comenta a oncologista.

O paciente lembra que passado o desafio pré-cirúrgico, veio a tensão pós cirurgia, de aguardar
o resultado do exame para descobrir se houve metástase. “Fiquei uma semana esperando para
saber se o tumor ficou enclausurado ou se espalhou. Todo esse período tenso, ainda passando
por um divórcio e por uma briga pela guarda da minha filha… Acho que ter um câncer era o
menor dos meus problemas naquela época”.

Com o resultado favorável, ele foi relaxando e passou a contar sua experiência com muito bom
humor: “Foi muito difícil quando, na véspera da cirurgia, o médico falou que eu tinha que
depilar a região. A minha então namorada que depilou; é muita confiança para uma namorada
de pouco tempo. Você dá uma gilete de três lâminas e ela, depilando e perguntando: quem é
essa fulana do Instagram que você segue? Foi difícil, bem difícil”, brinca.

Ele revela que gosta de levar suas vivências para o seu show de humor, mantendo seu lema:
“tudo que o hoje acontece comigo de ruim, sei que amanhã eu vou rir”.

E é sorrindo que ele conta um dos maiores desafios de adaptação: nos momentos de
relaxamento, quando está vendo TV, por exemplo, e passa a mão pelos testículos, acha muito
estranho sentir a bola de poliuretano. “Não me acostumei ainda. É como ter uma casa bem
rústica com uma Alexa (assistente virtual da Amazon), aquele aparelho todo high tech, no
meio. Você fala assim: ‘pô, isso funciona, mas não é daqui’”.

Conselhos de quem trilhou a jornada

“Eu fiquei bagunçado com a palavra câncer, porque ainda é um tabu. Quando as pessoas
ouvem essa palavra, acham automaticamente que câncer é igual a morte. Tanto que quando
vencemos o câncer, o olhar que recebemos… Parece que você é o Capitão América, é o
Homem de Ferro salvando o mundo do Thanos. Porque você venceu o maior vilão da história,
que é o câncer. Mas tem doenças que podem ser muito piores. O câncer, dependendo do
diagnóstico, do período que você descobre, tem um tratamento muito eficaz. Algumas
doenças não têm”, reflete Diego Menasse.

Por conta dessas reflexões, procura ajudar os amigos que passam pela jornada oncológica a
encarar de uma forma mais leve. “Alguns recebem diagnóstico de câncer, nem é de testículo, e
vêm falar comigo para eu ajudá-los a acalmar. Eu falo: ‘relaxa, vive um dia de cada vez e vê o
que dá pra fazer. Ouve o médico. Não sofre por antecipação. Tira esse tabu da sua cabeça e
vive’. Acho que o melhor é entender a doença e não exagerar, não deixar maior do que é”.

Ele também aconselha os homens a compreenderem que em algumas situações não é legal
fazer brincadeiras. “Quando um homem tira o testículo, tem uns caras que gostam de ficar
chamando de monobola, essas piadas de tiozão do pavê dos anos 70, do tipo ‘é pavê ou
pacomê?’. Mas precisam saber que não é legal falar para alguém que acabou de receber o
diagnóstico – muitos homens não vão fazer a cirurgia já pensando no bullying que vão sofrer”,
destaca. “Quer fazer a brincadeira? Dá um tempo. Não faz esse tipo de comentário quando a
pessoa descobre a doença nem logo depois que ela tira o testículo. É uma recuperação chata,
você fica um mês andando meio curvado, está sensível, digerindo tudo. Você tirou uma parte
que estava doente, podia espalhar, te matar”.

O paciente procura, ainda, incentivar a prevenção. “Eu estou com 40 anos, vou fazer exame de
toque. Tenho amigos da minha idade que falam que preferem morrer, porque tem esse
estigma”, comenta. Ele argumenta que é uma besteira pensar isso diante da vantagem de
diagnosticar um câncer precocemente. “O pessoal é muito ‘machão’. Eu falo: ‘cara, vai e faz o
exame’”.
Diego Menasse considera que o impacto mais positivo da experiência é poder compartilhar
com humor. Por conta das histórias em seus shows, já foi convidado a dar palestra a pacientes.
“É bom poder transformar isso em piada e fazer uma galera dar risada. Eu consegui”.

 

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