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Técnicas ajudam pacientes a vencer a doença sem abandonar o sonho de ter filhos

gravidez Gabriela Tertu recebeu o diagnóstico aos 20 anos. Era para ser mais uma consulta médica de rotina, mas a história se passou de forma bem diferente naquele dia. O médico parecia mais solene que de costume, viu o laudo do exame e não demorou a dar a notícia: era um câncer de útero, um coriocarcinoma, e a recomendação era a cirurgia imediata. “Foi um baque muito grande. Meu sonho sempre foi ser mãe e naquele momento eu soube que ia perder o útero, que não tinha outra saída”, conta ela, hoje aos 21 anos.

O pesadelo, felizmente, acabou. Gabriela foi buscar uma segunda opinião e no dia seguinte começou o primeiro de sete ciclos de quimioterapia. O tratamento foi um sucesso, o que significa que não houve necessidade da cirurgia. “Agora estou curada. Em seis meses, estou apta a engravidar, o que não está nos meus planos agora, mas com certeza é um sonho que vou realizar na hora certa”, diz a estudante de Pedagogia.

A história da Gabriela pode ser mais comum do que se imagina, e quase sempre é possível preservar a fertilidade. A ginecologista Sue Yazaki Sun, coordenadora do Setor de Doença Trofoblástica Gestacional e Neoplasias na Gravidez da Unifesp (Escola Paulista de Medicina), ensina que a quimioterapia é o tratamento de escolha em casos como esse. “O coriocarcinoma é um tumor essencialmente de tratamento quimioterápico. A cirurgia de retirada do útero é reservada para casos especiais e deve ser uma exceção”, esclarece a especialista, para quem a doença ainda é pouco reconhecida. “Existe pouca informação sobre esse tipo de tumor mesmo entre os ginecologistas”, diz Sue, atenta à importância da educação continuada. “É um câncer de baixa incidência, que em metade dos casos pode vir depois de uma gravidez molahidatiforme, a chamada gravidez molar, e na outra metade depois de uma gravidez normal”, explica. “O diagnóstico é fechado a partir da história clínica da paciente e da dosagem de um hormônio chamado gonadotrofina coriônica, mas o médico muitas vezes não considera a hipótese de um tumor trofoblástico e não investiga”.

Outro comportamento frequente que compromete o diagnóstico vem das próprias pacientes. Pouco informadas dos riscos da doença, muitas mulheres não retornam para buscar o resultado dos exames depois de uma curetagem para um aborto espontâneo, por exemplo, e deixam de lado o acompanhamento médico.

Para mudar esse panorama, um grupo de especialistas quer difundir a importância da neoplasia trofoblástica e dos tumores gestacionais. “Queremos mostrar que a neoplasia trofoblástica e o coriocarcinoma não recebem a devida atenção. A ideia é sensibilizar o Programa de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde e mostrar que precisamos de mais educação médica continuada nas unidades básicas. O médico precisa saber reconhecer os casos de neoplasia trofoblástica na fase inicial para evitar que o tumor evolua para a forma avançada”, alerta Sue.

Técnicas ampliam possibilidades de fertilização após o câncer

Câncer e fertilidade é assunto sério. Em pacientes jovens, em plena idade reprodutiva, a preocupação é mais que natural. O que dizer então de crianças em tratamento oncológico? A oncologia vive progressos sem precedentes, mas eleger o melhor regime terapêutico significa ter em perspectiva a qualidade de vida hoje e no futuro. “Principalmente para crianças antes da puberdade, adolescentes, homens e mulheres mais jovens, uma das considerações mais importantes é determinar o tipo de tratamento para saber se haverá prejuízo da fertilidade após a recuperação”, diz o médico Jorge Haddad Filho, coordenador do Programa de Reprodução Assistida do Serviço de Reprodução Humana do Hospital São Paulo – Sociedade Paulista para o Desenvolvimento da Medicina.

Os números dão a dimensão do problema. Estudo publicado em 2010 estimou que  um em cada 250 adultos será sobrevivente do câncer e os médicos envolvidos no tratamento precisam estar atentos a essa nova realidade.

Na distribuição por gênero, calcula-se que, anualmente, 650 mil mulheres são atingidas pelo câncer invasivo e 8% delas (52 mil) têm menos de 40 anos. Estimativas mostram que uma em cada 52 mulheres vai ter câncer antes dos 39 anos, o que sem dúvida reforça a importância de pensar na fertilidade durante o tratamento oncológico.

A radioterapia pode danificar ou até destruir os ovários quando realizada no baixo abdômen, dependendo do tamanho, da localização do tumor e da intensidade da irradiação empregada. Quando isso acontece, a mulher pára de produzir hormônios e entra na menopausa, impedindo a gestação com seus próprios óvulos. O mesmo pode ocorrer com a quimioterapia, que dependendo das drogas utilizadas e das doses necessárias para a cura da doença pode prejudicar a função ovariana.

A boa notícia é que técnicas para preservação da fertilidade podem dar um auxílio valioso durante o tratamento do câncer. Confira as dicas do Programa de Reprodução Assistida do Serviço de Reprodução Humana do Hospital São Paulo:

No homem

Congelamento do sêmen

É um processo realizado com técnicas bem estabelecidas e resultados confiáveis. O sêmen é coletado através da masturbação, preferencialmente em várias amostras. Será congelado a -196 °C, armazenado por tempo indeterminado, podendo ser descongelado e utilizado no momento adequado.

Quando houver urgência para o início do tratamento oncológico, pelo menos uma amostra de sêmen deverá ser congelada.

Congelamento de tecido testicular

Embora o congelamento do sêmen seja uma opção simples e de fácil execução, o congelamento do tecido testicular pode oferecer uma opção a longo prazo, principalmente nos casos de alguns tumores que prejudicam a qualidade do sêmen. É ainda uma técnica experimental, mas pode em alguns casos ser a única opção. Espera-se que no futuro, com o avanço das pesquisas com células-tronco, o congelamento testicular possa ser uma alternativa ainda mais interessante.

Na mulher

As meninas nascem com um número limitado de óvulos. A quantidade de óvulos diminui gradativamente a partir da primeira menstruação até chegar na menopausa, quando já não existem mais óvulos disponíveis para serem fertilizados. A radioterapia e a quimioterapia tendem a acelerar ainda mais esta perda da capacidade reprodutiva.

Novas técnicas têm proporcionado esperança para preservar ou recuperar a fertilidade em meninas e mulheres submetidas ao tratamento do câncer. É o caso do congelamento de embriões, de óvulos ou do próprio tecido ovariano, além da possibilidade de transposição dos ovários noscasos que requerem tratamento com radioterapia.

Congelamento de óvulos

É uma técnica muito importante por oferecer bons resultados e a mais usada hoje na prática. A paciente é submetida a um tratamento de indução da ovulação semelhante ao da fertilização in vitro, com a retirada dos óvulos e posterior congelamento. Se a paciente necessitar de quimioterapia e puder esperar três semanas para o início do tratamento, o ideal é promover a estimulação ovariana através de hormônio, para que haja um número maior de óvulos para o congelamento, o que vai garantir melhores resultados no futuro. O tipo de medicação vai depender da sensibilidade do tumor ao estrogênio, mas há casos em que expor a paciente a esse hormônio pode até piorar a evolução da doença. É importante saber que existem estratégias adequadas para indução da ovulação mesmo nas mulheres que não podem receber os hormônios convencionais. Em alguns casos, os óvulos podem ser maturados no laboratório por uma técnica especial (maturação in vitro) para posterior congelamento. Dessa forma, é possível diminuir ainda mais o tempo de exposição da paciente ao estrogênio.

Medicações que protegem os ovários durante a quimioterapia

Vários estudos demonstraram que o uso de uma classe de medicamentos chamada de análogos do LHRH (que é um hormônio produzido pelo hipófise) uma semana antes do início da quimioterapia protege os ovários dos efeitos deletérios da quimioterapia. A maior parte dos estudos foi realizada em pacientes com câncer de mama. Um grande estudo recente apresentado no Congresso Americano de Oncologia Clinica (ASCO) de 2014 mostrou que em mulheres que receberam o análogo do LHRH antes de iniciar a quimioterapia, a taxa de falência ovariana (indução de menopausa) foi de 8% contra 22% para as mulheres que não receberam a medicação. Como esta classe de drogas pode teoricamente interferir com a eficácia da quimioterapia em pacientes com tumores que carregam receptores hormonais (estrógeno ou progesterona), a prática tem favorecido seu uso principalmente em pacientes com tumores de mama que não contêm expressão de receptores hormonais.

Congelamento de embriões

Através da fertilização in vitro, o ovário é estimulado com hormônios, os óvulos retirados e posteriormente fertilizados em laboratório. Formam-se os embriões que serão congelados em nitrogênio líquido a -196oC, permanecendo assim por tempo indeterminado. É considerada uma técnica eficaz, que proporciona taxas de gravidez ao redor de 40%, mas é restrita a pacientes que não necessitam de um tratamento oncológico imediato, além de ser indicada nos casos em que os tumores não são afetados por hormônios. Os embriões são legal e eticamente considerados seres vivos e em nenhuma hipótese poderão ser descartados. Na prática, são questões delicadas e que podem levar, muitas vezes, a conflitos judiciais. O congelamento de óvulos e de tecido ovariano não tem o mesmo compromisso.

Congelamento de tecido ovariano

Pode ser uma ótima alternativa em crianças que ainda não atingiram a puberdade e por isto ainda não têm óvulos para serem congelados. Também é uma técnica indicada para pacientes que não podem ser submetidos à indução da ovulação com hormônios. Através da videolaparoscopia, uma técnica cirúrgica minimamente invasiva, uma parte dos ovários é retirada e este tecido é congelado, permanecendo assim até o momento de ser reimplantado. Não existe um período pré-determinado. O tecido pode ser fragmentado ou não e pode ser reimplantado na região pélvica, sobre o outro ovário, perto das trompas (tópico), ouem outros locais, como a parede abdominal ou mesmo o braço (reimplante heterotópico).

Transposição dos ovários

Nas situações em que a radioterapia é indicada na região pélvica, os ovários poderão ser atingidos diretamente e ter a sua reserva ovariana prejudicada. Para evitar essa situação, uma cirurgia minimamente invasiva (videolaparoscopia) pode mudar provisoriamente a posição dos ovários para protegê-los durante o tratamento. Eles podem ficar por trás do útero, que servirá como um “escudo” protetor durante o período do tratamento, ou em outra localização distante do local atingido pela radiação. Após o término do tratamento, os ovários poderão voltar para o local original, através da mesma técnica cirúrgica.

Esclareça suas dúvidas

Se você tem interesse no tema câncer e fertilidade e atravessa um tratamento oncológico, algumas questões podem servir de roteiro para uma conversa com seu médico ou mesmo para orientar as escolhas futuras.

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