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Caçadores de Medula

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Instituto Vencer o Câncer traz histórias inspiradoras de pacientes no mês do Dia Mundial do Câncer

O menino de pouco mais de um ano que levava nas costas uma placa simples, de papelão, onde se via escrito “Caçador de medula”, chamava atenção entre os que participavam da ação para estimular a doação de sangue. O impacto da cena chegou até o hospital em que André Torres, hoje com 36 anos, estava em uma das internações que passou durante seu tratamento de Leucemia Aguda Indiferenciada com mutação genética do cromossomo Filadélfia, na esperança de encontrar uma medula compatível.

Aquele foi o momento de “virada de chave”, conta, quando o filho virou herói do pai, que decidiu se superar. “Eu estava internado, meu filho estava lá fora, mesmo sem entender o que estava acontecendo, tentando salvar a vida do pai que precisava de um doador de medula. Naquele momento eu decidi: agora eu vou fazer de tudo”.

Ele conta que foi nesse momento que nasceu o “Caçadores de medula”, mas a história começa antes, em 20 de junho de 2018, quando teve o diagnóstico. Com o trabalho em uma empresa de alta performance, parar um dia seria prejuízo, por isso ele tomava analgésico para amenizar a dor de cabeça forte e o estado febril que persistia por quase duas semanas. Até que um dia, por pressão da esposa e da mãe, decidiu ir a um hospital; lá, tanto ele quanto o médico que o atendeu acreditavam que não passava de estafa mental.

Quando pediram para repetir o exame de sangue, Torres acreditou que a quantidade não havia sido suficiente e achou um exagero quando o médico avisou que ele tinha uma doença no sangue e precisaria ficar internado para fazer mais exames e diagnosticar mais rapidamente. Só ficou porque os médicos foram muito incisivos. Na mesma noite, uma hematologista entrou no quarto e avisou: você tem leucemia, precisamos agora descobrir o tipo.

“Foi assim, na lata, e eu senti o chão abrir. A gente sempre acha que notícia ruim só vai para os outros, e foi meu primeiro aprendizado, que ela também bate na nossa porta”, recorda. “Minha esposa me abraçou, foi aquele chororô, mas ela disse algo que jamais esqueci: ‘A gente vai entrar num buraco, não sabemos onde vai dar, mas nós vamos sair’. Foi com essa vontade que nós seguimos, e dali para frente foi sempre nós, eu nunca estive só: era nosso diagnóstico, nosso exame, a família inteira estava junta. No diagnóstico de câncer não fica doente só o paciente, mas a família toda”.

Transferido para um hospital mais especializado em uma UTI imóvel, achou exagero também todo aparato – hoje considera que a inocência de não perceber a gravidade do diagnóstico o ajudou a não ficar tão desesperado: conta que estava com 96% de blastos, ou seja, 96% de células cancerígenas no sangue. Também acredita que ajudou não saber que tinha 60% de chance de não aguentar a primeira quimioterapia – apenas a esposa sabia, mas não contou. Com o diagnóstico completo, começou o tratamento com quimioterapia e por conta do tipo de leucemia já tinha indicação de transplante de medula.

Até chegar o resultado do teste, Torres tinha certeza que um dos dois irmãos seria compatível e a questão do transplante se resolveria em família, mas não foi o que aconteceu. “Deus começou a mostrar que não é bem assim, que tinha algo a mais para mim, porque se um deles tivesse sido compatível eu não teria entrado nessa militância, não conheceria as dificuldades. Começava o meu propósito”.

Ele conheceu a dificuldade de conseguir um doador compatível e descobriu como as probabilidades eram difíceis. A única maneira de melhorar as chances era aumentar o número de doadores de medula óssea cadastrados. Foi então que a família começou a realizar diversas campanhas em parceria com o hemocentro de Fortaleza, onde moram. Participavam de ações de doação de sangue, promoviam iniciativas em empresas, palestras em escolas. “Montamos um QG da medula óssea, eu ligava para empresas às quais tinha acesso, para amigos, falava com o RH avisando que estava fazendo tratamento de leucemia e precisava encontrar um doador de medula óssea. Tivemos uma aceitação grande. Em três meses conseguimos cadastrar mais de 1500 pessoas”, afirma. “Me fez sentir útil. Quando você está no tratamento de câncer, para de trabalhar e fica com a sensação de que está dando muito trabalho aos familiares. Você se sente inútil. Sentir-se útil faz toda diferença no tratamento”.

Apesar de não encontrar seu doador, percebeu que o aumento de cadastrados para doação estava ajudando outras pessoas e resolveu criar o perfil “Caçadores de medula”, com a intenção de motivar mais pessoas. “Deus tocou meu coração. Vi que o que eu estava passando, as dores, o deserto, as dificuldades, tudo tinha um propósito, não era em vão. Foi o que fez a diferença na minha vida e ajudou o meu tratamento a se tornar mais leve”. A medula que salvaria sua vida chegou dos Estados Unidos. “As chances de encontrar um doador no Brasil é de um para 100 mil; quando entra no cadastro mundial, é de 1 para cada um milhão. Digo que foi a Mega-sena da vida”. Na época, ele só sabia que recebeu a medula de uma mulher americana.

Depois de um ano e meio do transplante pode solicitar para conhecer a doadora, com quem mantém contato e não cansa de dizer: “Ela é uma pessoa maravilhosa, muito feliz por ter tido a oportunidade de realizar o transplante e ter salvo uma vida. Ela sabe a importância. Embora eu tente descrever ao máximo o que ela significa para mim, acho que em palavras nunca vou conseguir. Só um abraço vai mostrar o quanto ela é importante; ainda não consegui ir aos Estados Unidos para isso, mas vai acontecer. Da mesma forma que não é apenas o paciente que fica doente com o diagnóstico, o doador não salva apenas o paciente, mas a família inteira. Evita que um ciclo de tristeza aconteça. Sem essa boa ação dela meu filho poderia crescer sem a lembrança do pai, minha esposa ficaria viúva e meus pais teriam que viver essa dor”.

Fez o transplante em fevereiro de 2019, em São Paulo, onde precisou ficar por cinco meses. Ainda está em recuperação da doença – ficou um tempo de cadeira de rodas, depois de andador e muleta. Segue evoluindo e dedicado ao propósito que descobriu em meio à dor, de sensibilizar mais e mais pessoas a se cadastrarem como doadores de medula óssea. Membro do Comitê de Pacientes da Abrale – Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia e parceiro do hemocentro de Fortaleza, participa de campanhas, ações, divulga relatos próprios e de outros pacientes no perfil @caçadoresdemedula para sensibilizar mais pessoas.

É esse final feliz que vive em sua história que Torres esperava poder ajudar a proporcionar a outras famílias.

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