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Inteligência artificial constrói novo horizonte para a Oncologia e a saúde em geral

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Esqueça um pouco o CHAT GPT e outros recursos de inteligência artificial que podem ajudar a escrever, desenhar, pintar. Vamos direcionar o nosso olhar às transformações que a Inteligência Artificial poderá promover em um futuro muito breve para melhorar tanto a Oncologia quanto a saúde de modo geral – e o que já está fazendo.

Leia também: Melhora no cotidiano da saúde com inteligência artificial já é realidade

“É um horizonte que está sendo construído”, comemora Fernando Moura, oncologista clínico e gerente médico do Programa de Medicina de Precisão do Hospital Israelita Albert Einstein, empolgado com tudo que vislumbra e o que já vivencia em sua experiência no hospital, com aplicações do dia a dia. “É revolucionário”.

E se o exame de sangue comum, o hemograma, pudesse ajudar a descobrir um tumor mais precocemente?

Talvez ele já possa… Essa é uma das ferramentas que Moura pondera que poderá ser revolucionária, utilizando uma ferramenta simples que já existe e faz parte da rotina das pessoas, a biópsia líquida, ou hemograma, para rastreio de câncer. “Já temos biópsia líquida para genotipagem, ou seja, usamos o exame para saber a assinatura molecular do câncer e para encontrar o DNA do tumor que operou na circulação do paciente”.

A inovação, avisa, é utilizar o método na população sem qualquer diagnóstico de câncer e identificar sinais que o tumor deixa no sangue quando ainda está muito inicial, não detectável por métodos normais como mamografia (mama), papanicolau (colo de útero), tomografia de tórax (pulmão), PSA (próstata) ou colonoscopia (retal), para citar os cânceres que têm rastreio. Mas o método serviria para qualquer tipo de tumor. 

“Esses cinco tipos têm rastreio, mas quando o tumor é detectado já há um tempo de vida desse câncer. A biópsia líquida tem a capacidade de detectar fragmentos do DNA do câncer mesmo quando poucas células malignas já estão viáveis. E essas poucas células não são, por exemplo, sensíveis aos métodos tradicionais”. Ele ressalta que existem duas plataformas nos Estados Unidos bastante avançadas nesse método: Grail e Delfi.

Para chegar a essa identificação dos fragmentos do câncer na circulação no momento inicial do desenvolvimento do tumor foi utilizado o conhecimento adquirido a partir do sequenciamento do câncer avançado, com a percepção de que o fragmento do câncer é diferente do DNA da célula normal. Segundo o oncologista, a inteligência artificial consegue depurar o fragmento de ctDNA (DNA tumoral circulante) e determinar com precisão a origem da célula, ou seja, informar que encontrou um DNA tumoral na circulação de um paciente em determinado órgão. 

“O exame determina se o fragmento veio do estômago, da mama, do pâncreas, do intestino e assim por diante. A biópsia líquida já existia, mas o que está por trás da interpretação desse resultado é a inteligência de máquina que constrói um gabarito cada vez maior desses fragmentos”, diz. “Uma empresa apresentou no congresso ASCO o resultado de exames de 53 mil pacientes e detectaram sinais positivos de câncer em 1% da população examinada. O número não é grande, mas em termos de saúde pública pode-se economizar muito detectando precocemente em vez de tratar a doença metastática, sem contar o número de anos de vida ganho”, explica o oncologista.

O desafio – como todo esse conhecimento ainda é muito novo, o desafio, destaca, é como utilizar essas informações no cotidiano. “Se o exame de sangue detecta sinal de câncer no estômago, por exemplo, mas a endoscopia não aponta nada. O que fazer diante de um resultado positivo no sangue sem alteração de imagem ou clínica? Aguardar? Operar? Temos respostas para perguntas que ainda nem fizemos. O método pode ainda não ser suficiente para direcionar um tratamento subsequente, mas tem sensibilidade extremamente alta para detectar sinais de câncer ainda bastante iniciais”.

Além das decisões de tratamento, ele considera que é importante levar em conta o impacto emocional que a informação pode gerar para o paciente, e que todos esses fatores precisarão ser avaliados.

E se a imagem de tomografia de tórax ajudasse a determinar quem pode ter uma resposta melhor à imunoterapia? 

Fernando Moura traz outra inovação que se mostra bastante promissora, utilizando a tomografia de tórax de pacientes com câncer de pulmão. “Baseado na imagem e na densidade dos pixels, alguns autores já conseguem determinar se o paciente tem predição de resposta mais favorável à imunoterapia, por exemplo”, afirma. “Nós vemos a imagem da tomografia entre branco e preto. O algoritmo olha com mais precisão e a informação se traduz em um score, que é preditivo de resposta a este tratamento. Ainda não está sendo usada na prática clínica, mas essa ferramenta chamou muita atenção numa publicação no Lancet Digital Health, que é voltada a dados de tecnologia e inteligência artificial.

O oncologista acredita que em um período de curto a médio prazo a ferramenta poderá ser validada em estudos retrospectivos para ser usada de maneira prática no dia a dia. “É importante porque, de certa forma, vai ajudar a selecionar melhor o paciente para o tratamento, o que representará economia em saúde, já que custa de R$ 50 mil a R$ 60 mil por mês”.

E se apenas com o material já usado na anatomia patológica e um software com IA fosse possível determinar a presença da mutação do gene BRCA? 

Essa é outra aplicação que Moura acredita que poderá ser revolucionária, especialmente para regiões e populações que não têm acesso a testes genéticos.

Atualmente, para obter um diagnóstico da mutação BRCA para paciente de câncer de mama é preciso primeiro fazer a biópsia, a anatomia patológica, entender a história familiar da paciente, realizar um teste genético que detecta a presença da mutação ou não do gene BRCA. Há uma tecnologia que está utilizando a anatomia patológica, com um algoritmo baseado em inteligência artificial, que prediz apenas com base na imagem da lâmina da biópsia se a paciente tem ou não a mutação. 

“Com essa aplicação se elimina o intermediário, que é o teste genético, que custa caro e não é acessível a 70% a 80% do mundo. Já há empresas nos Estados Unidos cuidando disso. A sensibilidade dos algoritmos ainda não é tão próxima do teste genético, mas pode ser uma boa alternativa para locais que não têm acesso, como países de terceiro mundo e mesmo pacientes do SUS, que não dispõe de teste genético”. Para Fernando Moura, a facilidade de aplicar inteligência através de um software a recursos já existentes pode ajudar a combater o gap que existe entre o atendimento privado e o SUS, o primeiro mundo e o terceiro mundo. “Tivemos uma delegação que esteve na África e viu que mesmo em países considerados desenvolvidos dentro do contexto do continente, em muitos locais não se tem o mínimo necessário para fazer a Oncologia que praticávamos já nos anos 1990. Essas inteligências de máquinas talvez possam diminuir esse gap, porque o custo é menor, com aplicação de um software”.

Radiogenômica, do inglês radiogenomics, é o termo usado para definir a utilização de inteligência de máquina para entender a informação da imagem e fazer a correlação com a expressão gênica, ou seja, avaliação de mutações que apontam características hereditárias para desenvolvimento de tumores. “Isso já existe, por exemplo, com o câncer de pulmão, a partir da imagem da tomografia do tórax a ferramenta de inteligência de máquina projeta a chance de ter mutação no gene EGFR (importante biomarcador para esse tipo de tumor)”, esclarece o oncologista.

Da mesma forma, o banco de dados é construído a partir de milhares de tomografias de pacientes com câncer de pulmão com mutação EGFR, formando um algoritmo da densidade dos pixels da imagem. Essas informações de assinatura genômica do paciente ajudam na determinação de um tratamento personalizado, que garante melhor desfecho, menor toxicidade e melhor custo efetividade.

Como colocar na rotina e a preocupação com os falsos positivos

Para Thiago Willian Carnier Jorge, oncologista clínico coordenador do grupo de tumores gástrico intestinais do Hospital Osvaldo Cruz e diretor médico da startup We Cancer, a grande questão que fica é como colocar essas novas tecnologias no cotidiano do radiologista e do oncologista, por exemplo. “A dúvida maior é como processualizar isso. A melhor maneira de fazer, pelo menos hoje, é que isso sirva como screaming para chamar atenção, para que o radiologista dê mais atenção a resultados de exames que a inteligência artificial já filtra considerando que possa ser de alto risco”.

Uma preocupação, avalia, é com os falsos positivos. “Acho que diminui bastante os falsos negativos, mas a dúvida é em relação aos falsos positivos e do superdiagnóstico. Quando você traz para a pessoa a notícia de que ela pode ter um câncer de mama, mas não consegue achar nos exames tradicionais, como lidar com isso? É uma questão que temos com a genética, por exemplo”, cita, comentando o perigo da retirada profilática das mamas, de forma preventiva, com diagnósticos que podem não ser corretos.

Thiago Jorge fala também de casos de visão computacional que usa padrões de movimentação, da face e outras imagens para avaliar a situação do paciente. “É muito difícil em tumores cerebrais conseguir dizer se a doença está ou não progredindo, porque não notamos as pequenas pioras do paciente, apenas as maiores, como perda de força. A tecnologia com as imagens tem uma capacidade maior de notar isso”, diz “Há estudos feitos com doenças neurológicas e inclusive tumores cerebrais em que foram feitas filmagens dos pacientes em certo intervalo de tempo. Através dos registros conseguiam avaliar melhor se o tumor estava piorando”.

Ele cita ainda um estudo do MIT que comparava o tratamento de um paciente não real, mas criado com base em dados reais, realizado por médicos e por um robô. “O robô conseguiu tratar o paciente obtendo o mesmo desfecho, gastando menos quimioterapia e com menos efeito colateral. O médico trata de maneira empírica de acordo com os resultados dos exames. O robô conseguia predizer a necessidade da quimioterapia de acordo com a situação”.

Logotipo do Instituto Vencer o Câncer

O Instituto Vencer o Câncer é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), fundada pelos oncologistas Dr. Antonio Carlos Buzaid e Dr. Fernando Cotait Maluf, com atuação em 3 pilares: (1) Informação de excelência e educação para prevenção do câncer. (2) Implementação de centros de pesquisa clínica para a descoberta de novos medicamentos. (3) Articulação para promoção de políticas públicas em prol da melhoria e ampliação do acesso à prevenção, ao tratamento e à cura do câncer.

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